domingo, 28 de agosto de 2011

AS BEM DITAS ONDAS DE UMA CERTA MALDITA FLUMINENSE FM


AS BEM DITAS ONDAS DE UMA CERTA MALDITA FLUMINENSE FM







Por Cássio Ribeiro





Barão Vermelho, Capital Inicial, Paralamas do Sucesso, Legião Urbana, Kid Abelha e Lobão; esses e muitos outros representantes do rock brasileiro possuem algo em comum que marcou o início de suas carreiras nos idos dos primeiros anos da década de 1980. Todos eles foram lançados ao terem suas fitas K-7 demo tocadas por uma certa Rádio Fluminense FM, a “Maldita” de Niterói, no estado do Rio de Janeiro.

A Maldita foi antecedida por duas rádios de baixa potência existentes na década de 70; a Federal AM, do Grupo Bloch, e a Eldorado FM, chamada de Eldo Pop na época, e pertencente ao Sistema Globo de Rádio. As duas emissoras foram as primeiras representantes da cultura alternativa do rock no rádio brasileiro.

Em 1974, a Federal virou uma emissora AM popular, com o novo nome de Manchete AM. A Eldorado também mudou de estilo e nome em 1978, passando a ser chamada de 98 FM, ainda hoje uma emissora popular no RJ.

O jornalista Luiz Antônio Mello havia trabalhado na Federal AM e, já que o Grupo Fluminense de Comunicação (dono do jornal O Fluminense de Niterói) ensaiava a emissão das primeiras ondas de sua emissora FM no início da década de 80, Luiz Antônio, junto com o amigo e também jornalista Samuel Wainer Filho, apresentou o projeto de um programa chamado "Rock Alive" aos donos da emissora. Os dois ficaram surpresos ao receberem como resposta do Grupo Fluminense o aval para o controle total da Fluminense FM, tendo ambos a partir de então, a liberdade para fazerem o quisessem com a rádio.

A Fluminense FM, que estava sendo criada para ser uma rádio com perfil romântico, passou então por uma mudança literalmente radical: só mulheres na locução e nada de aceitar jabá (dinheiro das gravadoras para tocar músicas promocionais de um CD­, que na época eram discos de vinil). A mesma música nunca seria tocada 2 vezes no mesmo dia e as locutoras jamais falariam durante as músicas, que também não seriam atropeladas por vinhetas.

Sendo assim, às 6 horas da manhã do dia 1 de março de 1982, entrava no ar a Rádio Fluminense FM, a Maldita de Niterói, em 94,9 MHz. A programação apresentava a coletânea "Rock Voador", resultado da parceria entre a WEA e o Circo Voador, do RJ, responsável pelo lançamento de nomes como Celso Blues Boy e Kid Abelha. Outras atrações eram, além de consagrados nomes de peso do rock mundial, novas tendências da época como The Smiths, New Order, The Cure, U2 e veteranos não conhecidos como Joy Division e Dead Kennedys.






Galera da Maldita em 1982






Um show à parte na programação da Fluminense FM eram as fitas-demo dos até então desconhecidos Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, Lobão, Picassos Falsos, Plebe Rude, Capital Inicial, Barão Vermelho e muitos outros.

Era a época de abertura política no Brasil, após quase duas décadas de uma ferrenha Ditadura Militar (1964 – 1985), que governara o país sob moldes de repressão, perseguição política e censura imposta aos veículos de comunicação até o final da década de 1970. A Maldita foi a mola precursora do fenômeno do rock brasileiro da década de 1980, que representou o grito de liberdade de toda uma geração, neta dos chamados Anos de Chumbo.

Mesmo com precária qualidade técnica, as fitas-demo tocadas na Fluminense FM apresentavam criatividade e improviso musical melhor que as das faixas dos LPs das mesmas bandas lançadas pelas grandes gravadoras posteriormente.

Quem girasse o botão do rádio, percorrendo o dial FM carioca naquela época, logo encontrava lá pelos 94,9 MHz o som inconfundível da programação da Maldita, além das vinhetas totalmente originais: "noventa e quatro vírgula nove; Fluminense FM, a estação do rock", seguido pelo som da corda de uma guitarra arrebentando (PIM).

A Maldita, que começou na 15ª colocação de audiência entre as 16 emissoras FM cariocas em 1982, já era a 3ª em 1985, graças a um time de locutoras no qual se destacavam Mylena Ciribelli (Que hoje apresenta o programa Esporte Fantástico na TV Record), e Mônika Venerábile, a Monikinha, consagrada radialista brasileira, atualmente nos 1280 Khz da Rádio Tupi AM carioca.







Mylena Ciribelli: voz inconfundível

Mylena no início da carreira como locutora rockeira da Maldita, à direita

Sentados no estúdio da Maldita, o jornalista e fundador Luiz Antônio Mello e a então jovem locutora Mônika Venerábile, no início da década de 80. Principais programas da Fluminense na época: "Overdrive" (rock em geral), "Contracapa" (rock nacional), "College Radio" (rock independente dos EUA e Reino Unido), " Hellradio" (grunge e rock barulhento da linha pós-punk), "Hard Rock" (rock pesado) e "Fluminense News" (Entrevistas e demos)

Monikinha atualmente é locutora da Rádio Tupi do RJ






O melhor momento da Maldita foi entre 1985 e 1989. Em fevereiro de 1990, o fundador Luiz Antônio Mello deixou a emissora. No mesmo ano, a Maldita perdeu o direito de transmissão do programa "Novas Tendências" para a Rádio Cidade, ficando sem seu tradicional propagador de novidades.

Sem nomes de peso para sustentar seu tradicional estilo rockeiro, a Maldita virou rádio pop em março de 1990, e passou a tocar nomes que nunca tinham frequentado sua programação antes: Dee-Lite, Paula Abdul, George Michael e Technotronic por exemplo. Nessa época decadente da Fluminense FM, um locutor chegou a comparar o grupo estilo “menudo” New Kids On The Block com os Beatles.

Um ano depois, em 1991, a Fluminense voltou a ser rock graças a muitos protestos de ouvintes contra a programação pop. Porém, os tempos áureos e originais do estilo livre que a consagrou como a autêntica Maldita tinham ficado para trás. A nova programação rock da emissora era baseada no repertório da MTV que, recém-chegada ao Brasil, dava destaque para bandas comerciais de sucesso na época, como Nirvana, Red Hot Chili Peppers, R.E.M e Guns N’ Roses.


Passando por dificuldades financeiras, sem publicidade e com baixos índices de audiência, a Fluminense FM foi vendida para a Rede Jovem Pan em 1994. Curiosamente, numa alusão aos 94,9 Mhz da freqüência da Maldita, a emissora encerrou suas transmissões à meia-noite do dia 30 de setembro (Mês 9), do ano de 1994. A última música tocada foi "The End", do primeiro LP do The Doors, de 1967.








Último formato usado para a divulgação da rádio em adesivos e camisetas, antes da Maldita virar franquia da Rede Jovem Pam, em 1994







A Rede Joven Pan deixou os 94,9 FM da emissora de Niterói em 2000. Um grupo de DJs cariocas assumiu a rádio, que passou a se chamar Jovem Rio.

Em 2001, a Fluminense AM 540 KHz ensaiou um regresso ao estilo da antiga Maldita FM e, em 2002, com o fracasso da Jovem Rio, a Fluminense voltou aos 94,9 MHz do dial FM carioca. Quando perguntado sobre a volta da Maldita, o fundador Luiz Antônio Mello disse: "Não acredito em volta de 'E o Vento Levou', 'Beatles', 'Led Zeppelin', 'Leonardo da Vinci', 'Carlos Lamarca', 'Renato Russo', e, obviamente, da 'Maldita'. Por que? Porque o tempo não pára, e como bem escreveu Nelsinho Motta (nada do que foi será/ de novo do jeito que já foi um dia)."

Após o retorno da Fluminense FM, o estilo rock durou muito pouco por falta de dinheiro e anunciantes. A Maldita foi definitivamente vendida para a Rede Band News em 2005.

Dois livros contam a história da Maldita Fluminense FM; são eles: "Rádio Fluminense FM – A porta de entrada do rock brasileiro nos anos 80", da jornalista Maria Estrella (Editora Outras Letras), e "A Onda Maldita – Como nasceu e quem assassinou a Fluminense FM", do jornalista e fundador Luiz Antônio Mello, que falou sobre o livro em entrevista:

"Nosso pequeno exército venceu preconceitos que existiam (e ainda existem) em torno do Rock autêntico, peitou o lixo vivo da ditadura militar infiltrado na abertura política, enfrentamos sacanagens, sabotagens, fomos além dos nossos limites. Mas faltava a estrutura comercial, a mesma que faltou a Raul Seixas, Van Gogh, Jimi Hendrix, Mozart, e tantas belas figuras que viveram e foram enterradas depauperadas, ingratamente duras. Ah, sim, existe o chamado "reconhecimento depois da morte", mas e daí? Numa das últimas conversas que tive com Raul Seixas ele disse: (cara, estou duro, bêbado...ninguém quer gravar minhas músicas...mas quando estou fazendo um show eu vejo a putada que me fecha as portas metida na multidão gritando meu nome. Eu fico puto, desolado, arrasado)".

Por isso, reafirmo que essa é a última safra do livro "A Onda Maldita..." porque a rádio foi linda, foi maravilhosa, mas foi enterrada viva pela incompetência. Morreu burra, alienada, logo ela que foi berço da inteligência, da vanguarda dos anos 80. Não perguntem nada a mim pois creio ter respondido a tudo e a todos nesse livro. Perguntem quem foi a Maldita a Herbert Vianna, Bi, Barone, Dado Villa-Lobos, Lobão, Maria Juçá, Frejat, Dinho Ouro Preto, Luiz Carlos Maciel, Arthuer Dapieve, Tarik de Souza, Marcos Petrillo, Roberto Medina (a Maldita ajudou no repertório do Rock in Rio I), enfim, perguntem a quem viveu intensamente o Brasil de 1982 a 1985".

3 comentários:

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